Presidente da ABMRN faz apresentação sobre carreira única na segurança pública.
A adoção da carreira única nas instituições de segurança pública será tema de apresentação do presidente da Associação dos Bombeiros do Rio Grande do Norte (ABM-RN), Dalchem Viana, no 11º Congresso de Gestão Pública do Estado.
Com o título do trabalho "Adoção da Carreira Única: viabilidade de adoção e impactos em mudanças estruturais na Segurança Pública do RN", Dalchem pretende mostrar que o tema não é uma pauta exclusivamente corporativista, mas representa uma política pública "do maior interesse público", conforme suas próprias palavras. O Congresso, que será realizado entre 30 de agosto e 1º de setembro, é uma iniciativa do Governo do Rio Grande do Norte e da Escola de Governo Cardeal Dom Eugênio Sales, e tem a finalidade de gerar conhecimento na área de gestão pública.
A apresentação é resultado de um trabalho de conclusão de curso (monografia) de Especialização em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a Escola de Governo.
Como bombeiro militar, Dalchem estuda profundamente a administração da segurança pública e aponta um marco para essa vontade de mudança de paradigma: a Conferência Nacional de Segurança Pública. "A Conseg foi uma tentativa de fazer um debate mais amplo entre os entes municipais, estaduais e federal. E a partir dali você começa a entender porque nada muda em um sistema que permite 60 mil mortes por ano, porque isso não é revisto", avalia.
Ele atribui esse conservadorismo às estruturas de poder, dentro e fora das polícias, para manter as coisas como estão. "Não se pode falar, por exemplo, em polícia de aproximação se o gestor está totalmente distante da demanda social. Como um gestor que toma decisões tão longes da realidade social vai criar políticas de segurança adequadas?", questiona.
A monografia foi aprovada com nota máxima, sob a orientação da professora-orientadora Sandra Cristina Gomes, pós-doutorada em Ciências Sociais e especialista na área do resgaste histórico da consolidação dos Direitos Sociais da Constituição Federal. "Meu trabalho também tem um viés social porque as instituições de segurança pública reproduzem os estamentos e as classes, pois garantem privilégios para uma minoria manter o status quo e monopoliza toda a gestão. E quem sofre com isso é a sociedade."
Em seu trabalho, Dalchem também aborda a falta de sintonia entre as várias instituições de segurança. "Todas as outras políticas sociais, como por exemplo o SUS e o SUAS, já tem uma política de integração, mas um sistema unificado de segurança não existe no Brasil. A segurança é o filho renegado, o município diz que é do Estado, e o Estado diz que agora não poder arcar com tudo e quer entregar ao ente federal".
Além da falta de entrosamento, não existe planejamento das instituições. "O sistema é totalmente militarizado, não só as instituições militares, mas toda a segurança pública", afirma. "São meias polícias, sem integração, sem planejamento, com agências concorrentes. Por que um sistema assim não muda?"
Experiência potiguar
No Rio Grande do Norte, a luta pela adoção da carreira única tem duas frentes. A primeira, no Fórum de Segurança Pública, discute o tema com outras categorias "e também defende o fim de concurso público para chefe", conforme explica Dalchem. Uma das principais bandeiras do fórum é a carreira única, em todas as instituições de segurança pública.
Nesses últimos meses, as associações têm se pautado para mudar o Estatuto dos Militares e construir uma nova lei de organização básica. Para isso, foi instituída uma comissão formada pelo Executivo e as entidades representativas. O trabalho avançou, informa o presidente da ABM-RN, mas ainda não chegou a alguma conclusão. "Talvez, somos um dos poucos estados que tem uma proposta concreta para efetivação da carreira única, com critérios de interstício, tipo de formação, como é o processo meritocrático", diz.
A proposta foi apresentada no âmbito da comissão e em audiência pública na Assembleia Legislativa, mas o colegiado ainda não concluiu seus trabalhos. "Temos o apoio de vários deputados e quando a gente faz essa discussão com a sociedade a aceitação é muito boa, e os parlamentares começam a nos perguntar por que isso ainda não foi implementado".
Dalchem garante, com base em um parecer jurídico, que é possível os Estados implantar a carreira única sem a necessidade de uma alteração em legislação federal ou até mesmo da Constituição Federal. No entanto, as coalizões conservadoras que construíram essas instituições, em todos esses anos, não permitem mudanças.
Em defesa do ingresso único nas corporações, Dalchem argumenta que essa medida possibilita a ascensão da base dos operadores da segurança pública e vai garantir que outras reformas estruturantes sejam efetivadas - como a desmilitarização e o ciclo completo de polícia. "A sociedade tem que perceber que a carreira única vai permitir uma instituição com processo meritocrático constante, que vai ter um profissional muito mais adequado à gestão. O sistema é mais justo, mais adequado e mais eficiente", defende.
Pauta da Anaspra
A carreira única nas instituições militares é uma das principais pautas da direção da Anaspra. Nesse sentido, conforme a posição do presidente da Anaspra, cabo Elisandro Lotin de Souza, o modelo de duas carreiras, uma para chefe e outra para executores, é fator de desmotivação e desagregação da tropa. "Para além das questões profissionais, o modelo também é caro para o Estado e, em última análise, para a sociedade. O Estado precisa arcar, por exemplo, com duas academias de polícia, uma para praça e outra para oficial, o que gera custos desnecessários", argumenta Lotin.
Lotin, que também é integrante do Conselho Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, considera que a Constituição de 1988 prevê carreira única. "O espírito do constituinte originário, na questão da segurança pública, já trazia a carreira única como modelo, o que acabou não se concretizando por pressão se delegados e oficiais", explica. "Outra questão é que não há que se falar em inconstitucionalidade como comprovamos com estudo elaborado pelo jurista Lênio Streck".
Segundo o presidente, a adoção da carreira única democratiza as instituições, integrando-as interna e externamente. "Em suma, a carreira única trará integração, otimização de pessoal, economia de recursos, perspectiva para todos os profissionais", resume.
Ciclo completo
Outra pauta prioritária da Anaspra é o ciclo completo de todas as polícias, entre elas, a Polícia Militar. Esse modelo, adotado na Europa e na América do Norte, consiste na atuação plena das instituições policiais, ou seja, permite atuar na prevenção, na repressão e na investigação.
Conforme o presidente da Anaspra, a medida "agiliza a resposta para sociedade e otimiza o trabalho policial militar ao mesmo tempo que liberaria a Polícia Civil para a investigação de crimes mais relevantes, como por exemplo corrupção em nível estadual".